Foto pink

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domingo, 12 de abril de 2009

Tio César

Quando eu era bem pequenininha eu e a mamãe pegamos um ônibus e fomos para um lugar muito longe da minha casa. Lá as casas não eram bonitas como as da minha rua, e os carros, os pombos e os outdoors deixavam o lugar bem feio.
Entramos em uma daquelas casas. Havia uma mesa com várias pessoas em volta. Todas elas fizeram uma grande festa quando chegamos, abraçavam minha mãe e diziam “Meu Deus! Como a Talitinha cresceu!”. Eu não imaginava quem eram aquelas pessoas, mas eu nem me preocupava com isso, a cesta cheia de pães de queijo em cima da mesa era mais interessante.
Todos conversaram um pouco enquanto eu pensava em coisas fantásticas em algum canto, então uma porta abriu e dela saiu um homem alto, moreno, com cabelos cacheados escuro e mal cuidados. Ele me deu um grande abraço, em seguido juntou-se à conversa dos adultos. Uns cinco minutos depois, eu me encontrei fora do mundo da fantasia presenciando esse homem gritar com todos à sua volta e chorar com raiva. Eu não entendi muito bem o que aconteceu, mas a primeira impressão que tive foi que meu tio era um homem louco e assustador.
Um dia minha mãe chegou em casa e me contou que o Tio César ia morar com a gente e cuidar de mim. Eu fiquei apavorada! Mas como não tinha escolha, bolei vários planos para me defender daquele cara que havia gritado com todo mundo do nada.
Eu me lembro daquele dia que cheguei da escola e pedi ajuda com a lição de casa. Nós procuramos imagens e depois as colamos em meu caderno. Meu tio pediu para que eu guardasse meu material, isso fez com que surgissem dois chifrinhos e um rabinho naquela criança de cabelos vermelhos que fui.
Eu aproveitei que ele estava lavando louça na cozinha, peguei meu tubinho de cola e sujei toda a sala que ele havia acabado de limpar. Ele ficou louco da vida! Seus berros me deixaram bastante assustada. Ele me deu um pano de chão e disse que eu tinha meia hora para limpar a sala inteirinha. Meus bracinhos pequenos e gordos já estavam cansados de esfregar quando minha salvadora abriu a porta de casa.
“JÚLIO CÉSAR! POR QUE A TALITA ESTÁ ESFREGANDO O CHÃO DESSE JEITO? SERÁ QUE EU NÃO POSSO CONFIAR EM VOCÊ?!”
Meu tio me olhou com cara de bravo e contou tudo para minha mãe, ela duvidou um pouco da história dele, mas mesmo assim me deixou no banheiro por alguns minutos.
Apesar daquela imagem de louco e assustador, foi meu tio que me ensinou a pedalar as bicicletas sem rodinhas e ele também sempre me levava na pracinha de perto de casa. Eu não entendia o que fazia os meninos que jogavam futebol por lá rirem de nós. Mas as broncas que minha mãe dava nele deixava isso cada vez mais claro.
“César! Eu já falei quantas vezes que eu não quero que você use as minhas roupas? Você deixa todas elas largas e depois eu não consigo usar. Se você gostar muito de alguma coisa me fala que eu te dou de presente.”
Depois de alguns meses morando conosco, meu tio resolveu ir cuidar da casinha de Campos. Fiquei feliz a principio, seria o fim dos berros! Mas os dias passavam e eu sentia cada vez mais falta daquele jeitinho diferente de fazer lição de casa e andar de bicicleta.
Na hora das viagens meus pais perdiam a paciência devido aos infinitos “Pai, tá chegando?”. Eu não via a hora de chegar para olhar com cara feia para o titio e depois ir dormir no quarto dele. Aquela minha raivinha sem motivos e as broncas que ele me dava alegravam meu dia. Agora eu sei que as desavenças eram o nosso jeitinho de adorar um ao outro. Pena não ter descoberto isso antes de dizer adeus.

Um comentário:

Catarina Eya disse...

Ainda me lembro de quando eu dormia com ele. Sinto a falta dele, apesar de nao convivido tanto com ele. Me emocionei um pouco com o texto...:)